Participação

Participação

Websérie Doutrina Social da Igreja

O princípio da participação é consequente ao princípio da subsidiariedade e “se exprime, essencialmente, em uma série de atividades mediante as quais o cidadão, como indivíduo ou associado com outros, diretamente ou por meio de representantes, contribui para a vida cultural, econômica, política e social da comunidade civil a que pertence: a participação é um dever a ser conscientemente exercitado por todos, de modo responsável e em vista do bem comum”,1 assim, esse princípio se exprime na justa e necessária participação de toda a pessoa humana no desenvolvimento da sociedade, com sua parcela pessoal de contribuição, que também colabora para o seu próprio desenvolvimento, tendo como finalidade o bem comum, sendo necessária uma forte tensão moral para que a gestão da vida pública seja, verdadeiramente, fruto da corresponsabilidade de cada um em relação ao bem comum.1

O princípio da participação nasce da interdependência entre os homens, fruto de sua natural sociabilidade, exigindo que todos homens deem a sua parcela de contribuição para edificação da sociedade civil. Uma atenção especial deve ser dada aos menos favorecidos que facilmente são relegados de sua parcela de contribuição ou isolados da sociedade ou ainda se tornam escravos de políticas assistencialistas do Estado.

A participação e a democracia

Nos tempos atuais a democracia assumiu o papel predominante como forma de governo na maioria dos países do mundo. 

A Igreja vê com simpatia a democracia na medida em que ela favorece a participação dos cidadãos nas opções políticas e está fundamentada na Moral Católica ou lei moral, ou seja, sobre a base de uma reta concepção da pessoa humana.2 Assim sendo, “uma autêntica democracia […] é o fruto da convicta aceitação dos valores que inspiram os procedimentos democráticos: a dignidade da pessoa humana, o respeito dos direitos do homem, do fato de assumir o bem comum como fim e critério regulador da vida política.” 3

A Igreja Católica não possui uma forma de governo que especificamente defenda como sendo a mais legítima, pois um governo legítimo, na concepção da Igreja, manifestada na Sua Doutrina Social, é um governo onde as autoridades políticas são virtuosas e governam subordinados à Moral Católica em vista do bem comum, não sendo, então, uma forma de governo específica que a Igreja defenda de forma particular, mas sim um modo de governo virtuoso. 

É preciso que os católicos compreendam bem essa verdade, pois tem crescido no meio católico uma falsa compreensão sobre a democracia, advinda de contaminação ideológica, em especial da liberal, mas vista também em parte daqueles que defendem a ideologia marxista, e propagam a tese de que a democracia é um bem em si mesmo e a única forma de governo legítima, sendo por isso válido todo o esforço para sua defesa e manutenção, o que não é verdade, já que a defesa da democracia passa antes pela defesa de sua subordinação à Moral Católica. 

Não é raro observar no meio católico o uso do termo “democracia” para designar uma virtude, o que é falso. Primeiramente, o termo “democracia” tem sido mal utilizado para classificar comportamentos e hábitos, os ditos “estilo de vida democrático” ou “valores democráticos”, o que é um erro, pois a democracia é apenas uma forma de governo político, isto é, um sistema ou regime de poder na sociedade política. 4 Como forma de governo, que é o correto uso do termo, sua virtude está na dependência de sua subordinação à lei moral, caso contrário, não é uma democracia virtuosa e não deve ser defendida por nenhum católico, pois assim ela está em franca oposição à Doutrina Social da Igreja e se torna um meio de propagação de vícios e pecados pessoais e sociais.

Já alertou o Papa São João Paulo II quanto a essa “mitificação” da democracia: “Não se pode mitificar a democracia até fazer dela o substituto da moralidade ou a panaceia da imoralidade. Fundamentalmente, é um ordenamento e, como tal, um instrumento, não um fim. O seu carácter moral não é automático, mas depende da conformidade com a lei moral, à qual se deve submeter como qualquer outro comportamento humano: por outras palavras, depende da moralidade dos fins que persegue e dos meios que usa. […] sem um ancoradouro moral objetivo, a democracia não pode assegurar uma paz estável, até porque é ilusória a paz não fundada sobre os valores da dignidade de cada homem e da solidariedade entre todos os homens.” 5

O risco dos governos totalitários

Diante do desmantelamento moral da sociedade hodierna, desmantelamento esse fruto de um caminho de descristianização da sociedade que ocorre há pelo menos cinco séculos, tem se aumentado os riscos de assumir o poder do Estado um governo totalitário em que o fundamento do direito a participar da vida pública é negado na raiz, por ser considerado uma ameaça ao próprio Estado totalitário.6 Esse risco foi provado pela própria história, em especial no século XX, onde grandes governos totalitários assumiram o poder colocando em risco a paz no mundo e o bem comum das nações, como por exemplo o fascismo na Itália, o nazismo na Alemanha e o socialismo em muitos países do mundo inclusive permanecendo nos tempos atuais como podemos ver em Cuba, China, Venezuela, Coreia do Norte, entre outros.

Diante desses riscos constantes, a Igreja vê a democracia como uma forma de governo mais adequada ao nosso tempo para se evitar a ascensão ao poder desses governos totalitários, na medida em que ela “assegura a participação dos cidadãos nas opções políticas e garante aos governados a possibilidade quer de escolher e controlar os próprios governantes, quer de os substituir pacificamente, quando tal se torne oportuno; ela não pode, portanto, favorecer a formação de grupos restritos de dirigentes, que usurpam o poder do Estado a favor dos seus interesses particulares ou dos objetivos ideológicos.”

É bom especificar que considerar a democracia como uma forma de governo mais adequada ao nosso tempo não é o mesmo que tê-la como “única forma de governo legítima”, pois como dito mais acima, a Igreja não se opõe a nenhuma forma de governo em específico e sim ao modo de governo, à todo governo que não tem por fundamento a Moral Católica e que não tem como fim o bem comum, assim sendo, uma democracia que não possui esse fundamento e nem essa finalidade, a Igreja também se opõe, pois uma democracia que não se assente na lei moral também pode se tornar um governo totalitário, onde uma maioria aritmética, seja do povo, seja os seus representantes, definem o que seja bem e mal, assumindo uma autoridade que não lhes cabe, uma autoridade totalitária.

A participação democrática e os corpos intermediários

Essa maior participação das pessoas na vida comunitária, que a democracia favorece, é uma “das pilastras de todos os ordenamentos democráticos, além de ser uma das maiores garantias de permanência da democracia.” 7 Sendo o governo democrático definido a partir da atribuição, por parte do povo, de poderes e funções que são exercitados em seu nome, por sua conta e em seu favor, é evidente, portanto, que toda democracia deve ser participativa, contribuindo assim para uma maior participação das pessoas nos vários níveis da comunidade civil. Tal participação deve respeitar a ordem natural de uma sociedade orgânica, sendo assim, uma justa democracia deve favorecer a participação das pessoas na vida da comunidade civil fortalecendo e promovendo os corpos intermédios, pois serão nesses corpos que cada indivíduo dará o seu contributo para bem de toda a sociedade.

A não participação na gestão pública de cada cidadão através dos corpos intermédios e a falta de uma tensão moral que leva o indivíduo a reconhecer a sua responsabilidade pessoal para com toda a sociedade a que pertence, acaba por levar “o cidadão a formas participativas insuficientes ou incorretas e à generalizada desafeição por tudo o que concerne à esfera da vida social e política: atente-se, por exemplo, para as tentativas dos cidadãos de negociar com as instituições as condições mais vantajosas para si, como se estas últimas estivessem ao serviço das necessidades egoísticas, e para a praxe de limitar-se à expressão da opção eleitoral, chegando também, em muitos casos, a abster-se dela.” 6

O princípio da participação, então, não é um simples participar do cidadão na comunidade civil, por exemplo com seu voto, mas é antes a participação efetiva de todos os indivíduos na construção da sociedade, inclusive na esfera pública, mesmo que em graus variados, mas tal participação deve respeitar o princípio da subsidiariedade, explicado no texto anterior 8, e da solidariedade, que falarei no próximo texto, tendo sempre em vista o bem comum, que exige então, aquela forte tensão moral para manter os cidadãos ordenados para esse fim e, como cabe ao Estado a função de ordenamento, o Estado democrático deve ter um ancoradouro moral objetivo para cumprir tal função, como bem dito pelo Papa São João Paulo II na citação mais acima.

Salve Maria e Viva Cristo Rei!

Rômulo Felix do Rosario, casado, pai de 5 filhos, sendo 3 no Céu, médico pediatra, professor no Centro Anchieta (www.centroanchieta.org), uma iniciativa de fiéis católicos que visa promover a cultura católica nos mais variados âmbitos da vida do homem tendo como finalidade a busca da santidade. Coordenador do Projeto Social Vida, um grupo pró-vida da paróquia Nossa Senhora de Guadalupe, área pastoral de Vila Velha e Ministro Extraordinário da Distribuição da Sagrada Comunhão Eucaristia na mesma paróquia.

Referencias:

  1. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, cân. 189
  2. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, cân. 406
  3. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, cân. 407
  4. A Ordem Natural, Carlos Alberto Sacheri, Edições Cristo Rei, 1 ed., p. 248 – 249.
  5. Papa São João Paulo II, Evangelium vitae, nº 70
  6. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, cân. 191
  7. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, cân. 190
  8. https://bompastorpraia.com.br/o-principio-da-subsidiariedade/

Pascom Paróquia Bom Pastor

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